O lugar principal na Liturgia Ortodoxa Oriental pertence aos SACRAMENTOS nos quais é classificado pelos padres latinos ou, como ele é chamado em grego aos MISTÉRIOS (MYSTERION). Em siríaco ou aramaico a palavra “ROZO” – “MISTÉRIO” – é usada no Evangelho na forma, como nós a entendemos, quando usada para os Sete Sacramentos. Os SACRAMENTOS, como a IGREJA, são ambos visíveis e invisíveis; em todo o sacramento existe a combinação de um sinal visível no exterior com uma graça espiritual interior.


O termo “SACRAMENTO” ou “SACRAMENTAL” não é termo bíblico e também não é encontrado no Novo Testamento, embora existam idéias e realidades que indicam aquilo que esse termo quer designar como: BATISMO (Mt.3,6; 20,19; Lc.3,21; 2Cor.5,17); CONFIRMAÇÃO (Is.11,12; At.2,38; 10,38); CONFISSÃO (Mc.1,15; 2,1-12; 2Cor.5,20); EUCARISTIA (Mt.26,26-28; Mc.14,22-24; Lc.22,14-20; 1Cor.11,23-25); ORDEM (Mc.10,43-45; Jo.10,36; Hb.5,1-10; 7,24); MATRIMÔNIO (Mt.19,1-9; Ef.5,21-33): UNÇÃO (Mc.5,34-36; 7,32-36; Tg.5,14-15). Originalmente, designava um juramento ou compromisso solene, como o juramento militar do soldado romano. Visto que, na Igreja Primitiva, cristãos adultos renunciavam, por ocasião de seu Batismo, a todos os ídolos e juravam fidelidade a Cristo, voto que realmente era seu SACRAMENTUM, o termo pouco a pouco foi sendo aplicado ao próprio Batismo, e, mais tarde, também à Ceia do Senhor (Eucaristia).


Isso significa que o conceito “SACRAMENTO” veio depois, mas a realidade já estava em ação na Igreja. Nas comunidades neotestamentárias, essas idéias e realidades eram designadas pelo termo grego “MYSTERION” e na igreja primitiva pelo termo latino “SACRAMENTUM”. Sacramentum conferia um sentido religioso às ações da Igreja, unindo as dimensões visível e invisível, sendo um sinal externo e visível de uma graça interna e invisível, uma realidade que indica algo que está além dela mesma.


O Novo Testamento usava o termo MISTÉRIO (MYSTERION) para expressar a idéia de um “SEGREDO ABERTO”. Denota a verdade revelada, mas, assim mesmo, fora de nossa compreensão. Tais verdades incluem o ser de Deus (revelado por meio de seus atos), Jesus Cristo, Logos e Filho de Deus, que se fez homem sem deixar de ser divino; a salvação alcançada por Cristo e experimentada pelos cristãos, e a identidade da Igreja ao mesmo tempo divino-humana.


MISTÉRIO, portanto, é ato sagrado ordenado por Deus e no qual Ele, por certos meios externos ligados com sua palavra, oferece, dá e sela aos seres humanos a graça merecida por Cristo.


Em distinção do Evangelho, os Mistérios são atos e a Igreja faz uso destas coisas materiais na prática destes rituais litúrgicos, pois para haver um verdadeiro sacramento é necessário que ocorra três etapas subseqüentes, a saber: MATÉRIA (água), FORMA (a fórmula que o sacerdote profere durante o Batismo) e o SERVO DO SACRAMENTO (sacerdote canonicamente autorizado [At.3,13]). No Batismo se aplica água, na Ceia do Senhor se come pão e se bebe vinho, na Crisma se unge com óleo e faz-se dela um veículo eficaz do Espírito em sua mais alta elevação espiritual; no Matrimônio se coroa os esponsais, na Ordem Sagrada se apresenta o eleito ao sacerdócio ministerial, na Unção dos Enfermos se impõe as mãos sobre os doentes e se ora, na Confissão há a reapropriação do Batismo. Tudo isto, se dá, no plano sobrenatural de santificação dos fiéis. Somente estes sete enunciados, teológica e estritamente são os Sacramentos da Igreja.


Para os padres orientais, Mistério expressa uma “realidade invisível, impenetrável, que coloca Deus em relação com os homens, quando Ele se revela, sempre em ordem ao plano salvifica”. O próprio Deus que se revela é Mistério; enquanto entre os padres latinos, Sacramento, foi uma palavra usada “para exprimir coisa sagrada e estritamente oculta”. Esta classificação substancial entre estes dois conceitos é fundamental para nossa compreensão sobre a “Matéria de Fé”.


A Igreja Ortodoxa costumeiramente fala de Sete Sacramentos, basicamente os mesmos Sete da teologia dos padres latinos. Somente no século XVII, quando a influência estava no auge a Lista tornou-se fixa e definitiva. Antes dessa data os Escritores Ortodoxos variavam consideravelmente quanto ao número de sacramentos: S. João Damasceno fala de dois sacramentos; Dinis, o Aeropagita de seis sacramentos; Jeasaph, Metropolita de Éfeso (século XV), de dez sacramentos; e aqueles teólogos bizantinos que de fato falam de Sete Sacramentos diferem quanto aos itens que eles incluem em suas listas. Ainda hoje o número sete não tem significado absoluto para a teologia ortodoxa, mas é usada primeiramente como uma conveniência para o ensino.


Existe uma divisão didática, a saber: o Batismo, Penitência e Unção dos Enfermos são chamadas de SACRAMENTOS DE MORTOS, ou seja, dons que estão mortos para a vida divina. E a Eucaristia, Crisma, Matrimônio e Ordem Sagrada como SACRAMENTOS DE VIVOS, isto é, vivos pela vida na graça. Em linguagem eclesiástica são meios visíveis de bênçãos espirituais, ritos religiosos instituídos por Cristo.


Cremos que todos os fiéis podem receber todos os sacramentos exceto o do sacerdócio que é ministrado apenas aos homens, mas na igreja primitiva, houve registros de ordenações de mulheres que logo desapareceu. Alguns dos sacramentos são ministrados uma única vez na vida como Batismo, Confirmação-Crisma (santo óleo MURON) e Sacerdócio. Os demais sacramentos podem ser ministrados mais de uma vez como o Casamento-Matrimônio e a Unção dos Doentes. Outro como Arrependimento-Confissão e a Santa Eucaristia são continuamente ministrados até o último suspiro.


Consideramos os quatro sacramentos: Batismo, Crisma, Confissão e Eucaristia como essenciais à salvação humana. Os demais sacramentos: Matrimônio, Sacerdócio e Unção dos Enfermos não são essenciais à salvação humana. Mas são importantes e dignos de valor para o crescimento espiritual dos fiéis na comunhão eclesial. Todavia, quando nós falamos de sete sacramentos, nós nunca devemos isolar esses sete de muitas outras ações da igreja que também possuem um caráter SACRAMENTAL, e que são convenientemente chamados de SACRAMENTAIS.


Entre o mais abrangente e o mais estreito sentido do termo “SACRAMENTO”, não existe uma divisão rígida: a completa vida cristã deve ser vista como uma unidade, como um único MISTÉRIO ou um grande SACRAMENTO, cujos diferentes aspectos são expressões em uma grande variedade de atos, alguns acontecidos de uma só vez na vida de um homem ou uma mulher, outras talvez diariamente.

Fica, portanto, claro que “MISTÉRIO” – “ROZO” em siríaco tem um conceito mais profundo do que a palavra “ESCONDIDO” ou “SECRETO”.


Os padres orientais siríacos, assim como S. Paulo, distinguem entre “MISTÉRIO” e “SECRETO” nos seus ensinamentos. Hoje a palavra “ROZO” – “MISTÉRIO” – na terminologia da Igreja significa um santo rito que produz uma graça invisível na alma da pessoa a que é ministrado e do qual ele ou ela recebe força espiritual, portanto, a palavra “ROZO” é usada para os dois sacramentos que não incluem ordenações proveitosas.


Na validade dos sacramentos a NATUREZA e ESSÊNCIA do MISTÉRIO são determinadas pela Palavra de Deus e realmente é o que Deus quer que seja, quando administro de acordo com as palavras da instituição. O sentido divinamente intentado das palavras da instituição pode ser aprendido apenas na Escritura Sagrada, mas o sentido em que as igrejas cristãs entendem e usam essas palavras deve ser estudado em suas famílias confessionais. É, portanto, a igreja, ou denominação, que determina o sentido em que os MISTÉRIOS devem ser administrados em seu meio. Em uma de suas cartas contra aqueles que diziam que os homens penitentes que uniram ao Sínodo de Calcedônia e anatemizou todos os que chamam o nosso único Senhor, Jesus Cristo, de duas naturezas depois da inefável união e voltam à fé ortodoxa devem ser novamente ungidos, S. Severius, escreve que os padres fizeram uma distinção quando falavam do Batismo: “dizem aqueles que o que foi Batizado em nome das três substâncias, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, mesmo tendo sido Batizado pelos heréticos, mas mesmo assim confesse as três substâncias, não deve ser rebatizado, mas converso das outras heresias, certamente deve ser aperfeiçoado (NEXTALMUN) pelo Batismo da Igreja. Esta opinião, os 318 padres reunidos em Nicéia seguiram e todos os que nutriram as Igrejas depois deles”.


Na tradição da nossa Igreja cremos no Batismo da criança quando pequenina, e, portanto, não esperamos até que o fiel atinja certa idade antes de receber os sacramentos do Batismo, Crisma e Eucaristia.


Os sacramentos ministrados uma única vez na vida, Batismo, Crisma e Sacerdócio não devem ser repetidos. Isto é feito de acordo com os ensinamentos de S. Paulo: “agora é Deus que vos confirmou conosco em Cristo e que nos indicou, ungiu e firmou seu espírito em nossos corações” (IICor.1,21-22).


Se esse sentido não concordar com o sentido em que Cristo os instituiu e quer que os entendamos, é evidente que tal igreja não tem os MISTÉRIOS instituídos por Cristo. Deve notar-se que aqui falamos da Validade, Natureza e Essência dos Mistérios, não de Benefícios e Bênçãos que é particular de cada família cristã.


Toda vez, onde e como Deus entra em contato com os homens, Ele o faz em ordem ao Plano da Salvação. E aí está o MISTÉRIO. A Santíssima Trindade é Mistério, enquanto Deus entra em relação com os homens, revelando-se como “Pai, Filho e Espírito Santo”. A Encarnação é Mistério enquanto nela. Deus entra em relação com os homens assumindo o próprio ser humano, que se une substancialmente ao VERBO (LOGOS). “O verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo.1,14). A IGREJA é MISTÉRIO porque, nela, Deus entra em revelação com os homens, tornando-O Povo Eleito, Santo, Sacerdócio Real, capaz de cultivá-Lo dignamente (1Pd.2,9). Os Mistérios, e (modos impenetráveis de Deus se comunicar com os homens, e os unira) são numerosíssimos. Sua lista é quase infinita. Entre eles se incluem também os SACRAMENTOS, os sete sacramentos, os quais a igreja oferece. E que nos põe em comunicação com Deus e realizam o Plano Salvífico-Redentor de Cristo. Mas, se os Sacramentos são Mistérios não são, estritamente, Sacramentos, é o que dilucidaremos em seguida.


Específico do Sacramento é que seja um sinal sensível e significativo da realidade invisível de comunicação com Deus. Assim, o sacramento é sempre palpável, visível, externo.


Tais são os Sete Sacramentos: Batismo, Confirmação ou Crisma, Penitência, Eucaristia, Matrimônio, Unção dos Enfermos e Ordem Sagrada. Todos são sinais sensíveis, concretos, da realidade invisível e mistérica da união dos homens com Deus.


Os Mistérios, a saber, a Trindade, a Vida de Deus (Encarnação), a Graça (Santificante) não são em si mesmos sinais sensíveis, da comunicação com Deus. E, quando se tornam sensíveis, palpáveis como a Encarnação e a Redenção podem dizer-se também SACRAMENTOS.


Enfim, na administração dos sacramentos na Igreja Ortodoxa, a EPICLESE (invocação ao Espírito Santo) é uma oração dirigida ao Pai, para que envie o Espírito Santo. Cada sacramento tem sua epiclese pela qual se pede o envio do Espírito Santo sobre aquele que vai recebê-lo e sobre a matéria por meio da qual vai ser administrado. A Igreja Ortodoxa é Pneumatológica.